terça-feira, 22 de dezembro de 2009

Araióses – Jardiel Carvalho (22/12/2009)

Que seja assim
Certo de que não suma
A identidade de mim
E me torne só mais uma
Uma pessoa longe de mim
E que o esquecer não me consuma

Busco agora
Tudo o que não quis
Tudo o que joguei fora
Pois sei o que não fiz

Cresci com meu pouco apreço
Mas hoje, hoje reconheço
Que cada coisas é tão rica
Nas raízes, e hoje fica
Muito claro que meu berço
Não é só maior que um terço
De tudo que me trisca
Sobro toda a minha Terra
Que ao longe alguém berra
Poe o gado pr’outro lado
E fecha o cercado
Acende o fogo com a faísca
E meio abestado fica
De ferver o leite fresco
Ao som do rio Santa Rosa
Que corta toda a cidade
Que é maternidade
Do José do João e da Rosa
Que trabalham na roça
E tangem as galinhas
E brigam com a culuminhas
Por que são muito atentadas

E cantam o Trem das Onze
Na boca do fogão
Pois o almoço, que não é muito não
Sai bem cedo, antes das onze

Em minha terra
Criança que erra
Toma uma pêia
E mulher feia
Casa, mesmo sendo feia

Nos dias de jogo na Lisa
Batia aquela brisa
Que ficava melhor assim
Com o gosto do dindin
De vez em quando era gol
Do Flamengo da Barreira
E subia toda aquela poeira
E a gente que era culumin
Fica ali na beira
Chupando o dindin

A gente rodava peão
Brigava e rolava no chão
Atravessava o rio a nado
E nem ficava cansado
Com a forte correnteza
Que com certeza
Ajudava a manter o braçado

Na semana santa
Tinha bolo de puba
E eu comia feito uma anta
E nem comia a janta
Tinha canjica de milho
E mãe gritando:
“Oh, filho! Come mais um pedacim”
E longe de mim
Querer pensar em esquecer
Toda aquela festa linda
Que era feita ainda
Nos festejos de Nossa Senhora
Nossa Senhora da Conceição
E tinha até procissão
Ave Nossa Senhora...
Tinha barraca de camelô
E um dia de Babão me melô
Mas o Zé Bode gritô
E o Babão chorô
Por que eu,
Eu não deixei barato
Melei todo o sapato
Dele e do Fabin
Que riu de mim
E mangou da minha cara
E eu ainda disse: “Para!”
Mas ele não me ouviu
Então no final fui eu quem riu.

Bom também era na praça
Onde todo mundo achava graça
Das piadas do Mereu
Que assim como eu
Ficava lá ate tarde
Mas ainda estou na metade
De tudo o que tenho
Pra falar e agora venho
Continuo a contar
Tudo que conseguir lembrar
Contar, contar...
As historias de terror
Que me causavam horror
Que com medo arrebatador
Corria pra chegar em casa
Que era quente que nem brasa
Mas me abraçava
Assim que eu chegava

Tinha uma vovó
Que cuidada do vovô
E dos filhos e dos netos
Era amiga de outra vovó
Que não ia nas festas
Que cuidava das galinhas
Botava nóis na linha
Mas tinha muito amor

Sei que todos a amavam
Seus filhos netos e amigos
Que não eram poucos
E se amontoavam
Pra comer feito loucos
Sua farofa de carne
Que todo fim de tarde
Ela servia com café
E tinha até
O Paulo Cazaca
Que sumia por meses
E aparecia como os fregueses
Do Bar do tio Valdir
Que quando tinha seresta
Ficava cheio, era festa
Onde tinha muita gente
Com chifre na testa
Era assim que se falava
Quando muita cerveja tomava
Toda aquela gente boa
Que não estava ali a toa
Pois era perto do rio
E nunca tava firo
E todo mundo
Ia lá pro fundo
Pra se refrescar
Nadar...

Tinha o clube do Nonato Ramos
A festa de Ramos
O Bumba meu boi
Quem nem sei quando foi
A ultima vez que dancei
E nem quando comecei...
Tinha o sete de setembro
Que se bem me lembro
Eu era doido pra tocar
Mas eu era criança
E me botavam pra marchar
E lá também comecei a cantar
No show de calouros
Com meus cabelos louros
Que sumiram com o tempo

Minha raiz ainda está
Fincada e forte
E espero que seja lá
Onde eu fique mais forte
Colossal é minha saudade
Só menor que minha felicidade
De ter nascido ao som das vozes
Da cidade de Araióses.

Uma coisa – Jardiel Carvalho

Quando me vem a mente
Todas as coisas
Que não penso constantemente
Me são só coisas

Costumo ser mais covarde
Sem vergonha de assumir
Quando cedo ou tarde
Penso em dormir

E esquecer todas as coisas
Que sem querer me vem a mente
Que são só coisas
Que não me vem constantemente

Que sejam úteis ou não
Estranhas ou convencionais
Maiores então
E apenas racionais

Que completem minha vida
E enfeitem meu existir
Que apareçam na ida
Antes de eu partir

Que sejam enormes
Cheias de cor e brilho
Que estejam nos conformes
Que me encha o olho

Que me causem uma reação
E que complete um vazio
Que me pare o coração
Ou me vença por um fio

Que constantemente
Sejam só coisas
Que me vem a mente
E que sejam boas coisas

Boas que
Ao envelhecer
Me lembre você
Que vi crescer

E me encham de alegria
Aumente o meu acreditar
E ao causar euforia
Me façam crescer, sonhar
E que tomem as tristezas
Me ampliem as saudades
Que me mostrem mais belezas
E me encham de amizades

E que cada coisa
Sempre em minha mente
Não seja só uma coisa
Que suma de repente...

quinta-feira, 17 de dezembro de 2009

O que me Transformei - Jardiel Carvalho

Ouço nas maravilhas
Que só minha alma
Se fará na partilha
Penetrando a calma...

Sinto que nem se fosse
Mais um qualquer
E houvesse nenhum sequer
Seria um bom que fosse...

Ao restaurar encanto
Que nem sempre existiu
Ousou, reprimiu
E me fez no entanto
Querer ser mais
Mais que o que eu quizesse
Ou sonhasse...

Sou apenas "o que me transformei"
Mas tambem sou o que
Me transformo constatemente
E com tudo o que tenho em mente
Me faço outro ser
Tendo em mente
Que a "Mudança"
É parte do vencer
E vencer é ser
Não o que era
Mas o que se pode ser...

sábado, 5 de dezembro de 2009

Que País é este? – Jardiel Carvalho

Que país é este?
É apenas o país em que se vive
Sei que nem ao menos esperança sobra
E no auge desta obra
Assim sobrevive
Com o pouco que as veste

Sem ser, ser que se questiona.
Assuntando aos pouco meros confusos
Queima de fronte a si próprio
Com dores de tanto ferver o pensar
E de tentar conservar
Apenas conta com pequenas fugas
Que fogem sempre da memória
Quando se tenta esquecer das desventuras

Alguma opinião que,
Possa eu expressar
É apenas uma opinião qualquer
Que nem a um agrada ou desagrada
E que nem ao menos faz qualquer diferença
Digo isso apenas a quem possa interessar
Aos que lêem meus poemas
E deles fazem alguma utilidade
Penso apenas em querer ser
Mais um poeta dos poucos
Que se sintam como eu oco
De mais coisas para acreditar...

Como Pessoa - Jardiel Carvalho

Concreta a sina de ser apenas um eu
Que sendo um tu que nada faz
E quando ele ou ela fizerem do mundo seu
E se nós fossemos apenas assim, como tu capaz.

Espreita a ida de ser, contudo fúria.
Mas não uma fúria por um mero acaso
E como não bastasse fosse num tempo escasso
Então faz de si uma breve rasura
E fura a casca de pau que te recobre
Com um tom pobre
Recobre e remenda a casca
Rejeita a face ideal
Que enoja ao centrado ao leal
Mas que sei eu de assuntos assim?
Acho que nem ao menos uma leve noção tenho eu
E quem tem?
Será que alguém tem respostas concretas?
Perguntas, somente questões.
Penso como Fernando Pessoa
Não vou ao fundo das cousas
Pois pensar muito nessas coisas
Tira todo o sentido que elas realmente tem...

quarta-feira, 2 de dezembro de 2009

O quanto você é diferente?
Diferente de mim ou de qualquer outro?
Faça essa pergunta a si mesmo quantas vezes forem necessárias. Se conseguir uma resposta me fale.
De onde nasce a intolerância?
Talvez da cabeça de gente muito inteligente, pois ela existe e é notável, como não afeta aos mais “bem de vida”, afeta sim aos pobres e humildes, aqueles que não conseguem se defender.
O que acontece se você se cortar? Se você ficar doente? Se você cair? E se você morre? Será que você é tão diferente de mim?
Nós seres humanos,somos feitos exatamente da mesma matéria, sejamos brancos, negros, asiáticos, índios, ou qualquer outra etnia...
Seja apenas humano, não faça com que sua existência passe em vão ou cheia de ódio.
De que serve todo o conhecimento do mundo se você não o colocar em pratica?
Pense um pouco e viva a vida sem causar danos a vida dos outros...

Coisa Vã - Jardiel Carvalho

Nunca pensei na vida
Como uma coisa vã
Pois sei, há um sentido
Na coisa vã
Eu sei, há um sentido

Começo por me perguntar
Como posso falar?
Ou então comentar?
Me ouço mais uma vez
Me perco de vez

Mas o que seria de mim
Se não fossem tais duvidas?
Sera que seria assim?
E eu, teria mais dádivas?

Continuo por pensar
Em como tudo tem ao menos
Um sentido a passar
É isso que temos

Aprendo com o balançar
O balançar das arvores
E pra enfeitar
Coloco nos pés mais rumores

E andando por aqui
Sou apenas eu
Sem medo do que me favoreceu
Mas saio daqui e vou ali
E logo antes de cair
Levanto mais uma vez
E com minha pouca altivez
Caio ao me sacudir

Me arrasto sobre o chão quente
A pele gruda na calçada
E preso a uma corrente
Assim de repente
Me ponho de pé
Cheio de feridas chagadas
Choro feito criança
Pois perco a esperança
E mesmo de pé
Com as mãos inchadas
Quebrando o dente
Corro na estrada
Que toda esburacada
Me rala e queima
De tão quente
Tão quente quanto todo o sol
Que já não me aquece
Esquece...
Que foi tudo em prol
De tudo o que é bom
E procuro o sentido
Que não antes perdido
Me da mais um dom
E de tom em tom
Vejo o cheiro do som
Que se cria da harmonia
Que enfeita essa fome
De querer ver sentido
Perde o dom
E desafia a fala
Ensurdece, e cala
Rasura a linha
Que a ti sempre abala
Remenda a corda
E todo o sentido
Que não é coisa vã
Remonta a vida...